Quem governa a Igreja no período da Vacância da Sé apostólica
Cidade do Vaticano (RV) – O Colégio Cardinalício governa a Igreja no período da Vacância da Sé apostólica. Suas competências e limites, segundo a Constituição Apostólica Universi Dominici Gregis são:
2. Durante o tempo em que estiver vacante a Sé Apostólica, o governo da Igreja está confiado ao Colégio dos Cardeais, mas somente para o despacho dos assuntos ordinários ou inadiáveis (cf. nº 6), e para a preparação daquilo que é necessário para a eleição do novo Pontífice. Este encargo deverá ser desempenhado nos termos e limites previstos por esta Constituição: deverão, por isso, ficar absolutamente excluídos os assuntos, que - quer por lei, quer por costume - ou são apenas do poder do próprio Romano Pontífice, ou dizem respeito às normas para a eleição do novo Pontífice, segundo as disposições da presente Constituição.
3. Além disso, estabeleço que o Colégio Cardinalício não possa de modo algum dispor acerca dos direitos da Sé Apostólica e da Igreja Romana, e menos ainda deixar que se perca, direta ou indiretamente, qualquer coisa deles, mesmo que seja para compor dissídios ou perseguir ações perpetradas contra os mesmos direitos após a morte ou renúncia válida do Pontífice [12]. Seja preocupação de todos os Cardeais tutelar estes direitos.
4. Durante a vacância da Sé Apostólica, as leis emanadas pelos Sumos Pontífices não podem de modo algum ser corrigidas ou modificadas, nem se lhes pode acrescentar ou subtrair qualquer coisa, nem dispensar, mesmo que seja só de uma parte delas, sobretudo no que diz respeito ao ordenamento da eleição do Sumo Pontífice. Antes, se eventualmente acontecesse de ser feita ou tentada alguma coisa contra esta prescrição, com a minha suprema autoridade declaro-a nula e inválida.
5. Se porventura surgissem dúvidas acerca das prescrições contidas nesta Constituição ou sobre o modo de as pôr em prática, disponho formalmente que todo o poder de emitir um juízo a tal respeito compete ao Colégio dos Cardeais, ao qual, portanto, atribuo a faculdade de interpretar os seus pontos duvidosos ou controversos, estabelecendo que, quando for necessário deliberar sobre estas e outras questões semelhantes, exceto sobre o ato da eleição, é suficiente a maioria dos Cardeais congregados chegar a acordo sobre a mesma opinião.
6. De igual modo, quando existir um problema que, segundo a maior parte dos Cardeais reunidos, não pode ser diferido para outra altura, o Colégio dos Cardeais disponha segundo o parecer da maioria.
23. Durante a Sé vacante, todo o poder civil do Sumo Pontífice, concernente ao governo da Cidade do Vaticano, compete ao Colégio dos Cardeais, o qual, todavia, não pode emanar decretos, a não ser no caso de urgente necessidade e apenas pelo tempo que durar a vacância da Santa Sé. Tais decretos só serão válidos para o futuro, se o novo Pontífice os confirmar.
(...)
7. No período de Sé vacante, haverá duas espécies de Congregações dos Cardeais: uma geral, isto é, de todo o Colégio, até ao início da eleição, e a outra particular. Nas Congregações gerais, devem participar todos os Cardeais não legitimamente impedidos, logo que tenham sido informados da vacância da Sé Apostólica. Contudo, aos Cardeais que, nos termos do nº 33 desta Constituição, não gozam do direito de eleger o Pontífice, é concedida a faculdade de se absterem, se assim o preferirem, de participar nessas Congregações gerais.
A Congregação particular é constituída pelo Cardeal Camerlengo da Santa Igreja Romana e por três Cardeais, um de cada uma das ordens, extraídos à sorte dentre os Cardeais eleitores que já tenham chegado a Roma. O ofício destes três Cardeais, chamados Assistentes, cessa ao completar-se o terceiro dia, sucedendo-lhes no lugar, sempre por meio de sorteio, outros três pelo mesmo espaço de tempo, mesmo depois de iniciada a eleição.
Durante o período da eleição, as questões mais importantes, se for necessário, são tratadas pela assembleia dos Cardeais eleitores, ao passo que os assuntos ordinários continuam a ser tratados pela Congregação particular dos Cardeais. Nas Congregações gerais e particulares, durante o período de Sé vacante, os Cardeais trajem a habitual batina preta filetada e a faixa vermelha, com o solidéu, cruz peitoral e anel.
8. Nas Congregações particulares, devem ser tratadas apenas as questões de menor importância, que se apresentem diária ou ocasionalmente. Se surgirem questões mais graves e merecedoras de um exame mais profundo, devem ser sujeitas à Congregação geral. Além disso, o que tiver sido decidido, resolvido ou negado numa Congregação particular, não pode ser revogado, mudado, ou concedido por uma outra; o direito de o fazer pertence somente à Congregação geral, e com a maioria dos votos.
9. As Congregações gerais dos Cardeais realizar-se-ão no Palácio Apostólico do Vaticano ou, se o exigirem as circunstâncias, noutro lugar julgado mais oportuno pelos próprios Cardeais. A elas preside o Decano do Colégio ou, caso ele esteja ausente ou legitimamente impedido, o Vice-Decano. Na hipótese de um dos dois ou mesmo ambos já não gozarem, nos termos do nº 33 desta Constituição, do direito de eleger o Pontífice, à assembleia dos Cardeais eleitores presidirá o Cardeal eleitor mais antigo, segundo a ordem habitual de precedência.
10. O voto nas Congregações dos Cardeais, quando se trata de assuntos de maior importância, não deve ser dado de viva voz, mas de forma secreta.***
Notas históricas sobre o Colégio cardinalício
Pelo menos a partir do século VI passou a ser chamado cardeal o presbítero ou o diácono que, pela sua capacidade, era transferido da Igreja, em serviço pela qual havia sido ordinado e da qual tinha o título, em outra igreja, da qual dependia (daí provavelmente ‘cardeal”, da palavra latina cardo). A partir do século VIII o título foi reservado aos clérigos incardinados na igreja catedral e que constituíam o conselho ou senado dos bispos. Em Roma, as categorias dos cardeais eram três: 1) os Cardeais Diáconos, que tinham a administração do palácio de Latrão, dos sete departamentos de Roma e o cuidado dos pobres que se encontravam neles; 2) os Cardeais Presbíteros, prepostos em modo mais estável às cinco maiores igrejas de Roma (São Pedro, São Paulo, São Lorenço fora dos Muros, Santa Maria Maior, São João de Latrão), onde desempenhavam seu serviço litúrgico; 3) os Cardeais Bispos, que eram prepostos às sete dioceses suburbicarias de Roma e assistiam o Papa nas cerimônias litúrgicas na Basílica de São João de Latrão. Todas as três categorias de cardeais eram o conselho ou o senado do romano pontífice e eram enviados por estes como legados, que o representavam também nos concílios ecumênicos. Como ajuda do Papa no governo não somente das dioceses de Roma, mas também da Igreja universal, já desde o Séc. XI os cardeais começaram a ser escolhidos também de várias partes do mundo e a agir como Colégio.
Individualmente os Cardeais são os principais colaboradores do Papa, quer como responsáveis pelos Dicastérios da Cúria Romana e no Governo do Estado da Cidade do Vaticano quer como titulares das mais importantes sedes episcopais no mundo. Colegialmente desempenham o papel de órgão consultivo sobre questões de maior importância no governo da Igreja através dos Consistórios convocados pelo Papa e de órgão suplente no Governo da Igreja e do Estado da Cidade do Vaticano durante a Sé Vacante. Mas a função mais importante e delicada para um cardeal é a eleição do Pontífice no Conclave. Como, de fato, afirma a Constituição apostólica Universi Dominici Gregis: "Gravíssimo é, pois, o encargo que pesa sobre o Organismo deputado para tal eleição". (RL – JE)
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